
Uma imagem contundente da poluição provocada por resíduos sólidos são as ilhas de plástico, lixões flutuantes nos oceanos, compostos por itens como garrafas pet, sacolas de supermercado e embalagens. A grande mancha de lixo do Pacífico, localizada entre a Califórnia e o Havaí, tem cerca de 1,6 milhão de km². Imagine as Regiões Sul e Sudeste, e mais 100.000 km² da Região Centro-Oeste, cobertas por um mar de plástico. Mas há um outro manto de plástico, certamente não tão espetaculoso, mas ainda mais perigoso. 3h6w62
Microplásticos, na definição de Frias & Nash [Microplastics: Finding a consensus on the definition] “são quaisquer partículas sólidas sintéticas ou matriz polimérica, de forma regular ou irregular e com tamanho variando de 1 μm a 5 mm, de origem primária ou secundária de fabricação, que são insolúveis em água”. Esses poluentes surgem de uma variedade de fontes: roupas, cosméticos, materiais de construção, sacolas plásticas e desgaste de pneus.
Os impactos dos microplásticos à saúde humana e ao ambiente vem sendo objeto de debates e estudos científicos. Eles estão no ar que respiramos, no solo, nas águas de rios e mares – e também na água que bebemos todos os dias. Há microplásticos nos alimentos, de hambúrgueres a ostras. Há estudos que indicam um possível incremento na probabilidade de ataques cardíaco, AVC’s e mortes. Os microplásticos adsorvem, into é, fixam-se em suas superfícies pesticidas, metais pesados, poluentes diversos e microrganismos causadores de doenças. Essas partículas estão em todos os ecossistemas e ambientes da Biosfera – inclusive sua casa.
Um estudo recente [A global estimate of multiecosystem photosynthesis losses under microplastic pollution LINK >>> https://www.pnas.org/doi/abs/10.1073/pnas.2423957122] analisa um outro prejuízo importante causado pelos microplásticos: perdas na produtividade agrícola, pela redução da atividade fotossintética de culturas como milho, arroz e trigo. Seus autores quantificaram uma redução global na fotossíntese entre 7,05 a 12,12% em plantas terrestres, algas marinhas e algas de água doce. Há duas maneiras de alimentarmos a humanidade: expansão de terras aráveis e aumento global da produtividade agrícola. A expansão de solos para a agricultura é inviável, pois implica a destruição de florestas e outros ecossistemas essenciais. Os esforços por uma agricultura que produza mais por unidade de área, sem desmatamentos, estão ameaçados, segundo seus autores, pela poluição plástica. Aqueles cientistas demonstraram que os microplásticos, quando em contato com plantas e algas, diminuem o conteúdo total de clorofila, e consequentemente, a produção fotossintética. Na agricultura as perdas anuais são de aproximadamente 360,87 MT na produção global de arroz, trigo e milho. A magnitude das perdas anuais de colheitas causadas por microplásticos (9,56%) é comparável às perdas (~10%) causadas pelas mudanças climáticas entre os anos de 1964 a 2008.
Os autores são enfáticos ao relacionar essas perdas à fome mundial. Em 2022, cerca de 800 milhões de pessoas – 10% da humanidade – foram afetadas pela fome como consequência de guerras, extremos climáticos, choques econômicos e desigualdade social. Eles argumentam que os impactos dos microplásticos na agricultura devam exacerbar esta crise, com um aumento de centenas de milhões de pessoas em risco de fome, mundialmente. Ademais, advertem os cientistas, a presença massiva de microplásticos em rios e oceanos têm resultado na diminuição na produção de pescados e frutos do mar, ameaçando a alimentação de 123 milhões de pessoas.
Há uma sinergia estarrecedora entre essas ameaçadas à segurança alimentar e a conservação da biodiversidade, em escala global. Os autores advertem que a fotossíntese é a base não apenas para o suprimento de alimentos para os humanos, mas também para funções ecológicas importantes, que incluem o ciclo de nutrientes e a alocação de biomassa do ecossistema, o armazenamento e a rotatividade de carbono do solo e o potencial de sequestro de carbono oceânico, dado que a fotossíntese do fitoplâncton contribui para quase metade da fixação anual global de dióxido de carbono. A redução da fotossíntese resulta em desequilíbrios nas relações predador-presa e à instabilidade geral dos ecossistemas.
Em suas conclusões, os autores esboçam recomendações óbvias, mas imprescindíveis: a redução no uso do plástico e o desenvolvimento de novas tecnologias para a redução da concentração de detritos plásticos no meio ambiente. Eles calcularam que uma redução de 13% nos níveis atuais de microplásticos ambientais poderiam reduzir as perdas nas safras de milho, arroz e trigo em 47 MT e em 3,16 MT na produção de pescados e frutos do mar.